Um espaço de memória e construção de identidades
Por Assessoria de Comunicação Institucional em 8 de junho de 2020
“As teias de Ariadne: Narrativas de Memória de Mulheres da Comunidade Quilombola Santo Antônio Dos Pretos, Codó – MA.”
Podemos conceituar memória como um movimento que se constitui a partir da interação entre diversos indivíduos de um determinado grupo que compartilham suas experiências individuais. Apreende-se que essa interação entre indivíduos é indispensável no que se refere à construção de uma identidade. O autor Maurice Halbwachs, em sua obra “Memória Coletiva”, apresenta a memória coletiva como um complemento da memória individual. Assim, entende-se que a memória individual não abarca todas as lembranças, portanto, necessita da contribuição coletiva para que preencha as lacunas.
Diante disso, com o objetivo de ressignificar histórias das mulheres negras da Comunidade Quilombola Santo Antônio dos Pretos, uma das principais comunidades quilombolas da Região dos Cocais, localizada a 44 Km de Codó/MA, alunos e professores dos Cursos de Letras e Pedagogia da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) – Campus Timon desenvolveram um projeto intitulado “As teias de Ariadne: Narrativas de Memória de Mulheres da Comunidade Quilombola Santo Antônio Dos Pretos, Codó – MA”. Esse projeto foi financiado pelo Edital da FAPEMA “Igualdade de Gênero”.
O projeto foi dividido em duas etapas: a primeira envolveu encontros com as mulheres da comunidade e a segunda etapa correspondeu à sistematização dos dados da pesquisa. Nos encontros, foram realizadas dinâmicas e rodas de diálogo – Roda Griô – em que as mulheres narraram histórias de seus cotidianos, com ênfase nas simbologias e particularidades do grupo. Nas Rodas, as mulheres fizeram uso de performance e oralidade, numa troca de saberes e experiências.
As histórias narradas tiveram o auxílio de objetos dispostos no centro, que serviam como “disparadores da memória” ou “muletas da memória”, com o intuito de auxiliar no processo de rememoração. Pequenos motes e canções, acompanhados por um tambor e outros instrumentos de percussão, foram entoadas por um membro do projeto que assumiu o papel de mediador.
De acordo com a professora de Literaturas de Língua Portuguesa, do Mestrado Acadêmico em Letras e Coordenadora do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Literatura e Linguagem – LITERLI, Silvana Pantoja, a proposta inicial do projeto era envolver apenas mulheres de meia idade e anciãs, por considerar que os relatos seriam potencializados pelo acúmulo de experiência. No entanto, os alunos e professores foram surpreendidos com uma quantidade considerável de jovens mulheres, muitas delas adolescentes, que chegavam aos encontros com seus filhos de colo e outros já crescidos.
“Com isso, decidimos mudar o percurso do projeto e envolver mulheres mais jovens, pois consideramos que a interação é enriquecedora para refletirmos sobre como as mulheres de diferentes gerações pensam sua condição de ser mulher nas relações de gênero dentro da comunidade. Isso, de fato, foi uma decisão acertada. Assim, o projeto envolveu aproximadamente 30 mulheres, sendo 20 com idade entre 50 a 83 e 10 entre 14 a 40 anos. Vale ressaltar que a mulher mais velha nascida na comunidade tem 70 anos”, destacou a professora. O projeto teve sua culminância na própria Comunidade. Como resultado, foi constatado que as histórias de vida das mulheres da Comunidade Santo Antônio dos Pretos estão ligadas à origem do grupo, aos costumes e às tradições, bem como às relações que estabelecem com o mundo que as circundam, envolvendo seus antepassados, através de seus rituais memorialísticos.
Além disso, a vida das mulheres mais velhas da comunidade é um desdobramento de suas ancestrais, um legado consequente de circunstâncias econômicas e sociais. Vida que se resume na labuta diária do trabalho doméstico e que se reveza com as atividades de subsistência, como o quebrar coco, o descascar mandioca, o pilar arroz, trabalhos que ainda marcam seus cotidianos. Carregam também a herança de terem uma prole numerosa – 8, 10, 12 filhos –, muitas não têm maridos, tendo de assumir, sozinhas, a dupla jornada.
“Consideramos que este projeto de extensão foi de grande relevância para o meio acadêmico, bem como à sociedade. Por meio das narrativas das mulheres foi possível reconhecer o importante papel que desempenham na comunidade, sempre com o brilho no olhar, a vontade de viver com alegria e de encontrar felicidade nos pequenos encantos da vida, ainda que a vida lhes ofereça tão pouco, isso considerando a nossa visão turvada pelo mundo capitalista”, concluiu a professora Silvana Pantoja.
Por Karla Almeida